20151118

Meu Avô, Pássaro-boi

As sandálias de couro de meu avô
eram sonolentas de barro e esterco

O barulho amuado plac-ploc, plac-ploc
era afogado pelo canto dos pássaros

As sandálias mutiladas de meu avô
mais pareciam pisadas de boi

E o couro e as sandálias,
medrados entre os pés e o chão

E o barro na insônia,
cedendo caminho aos pés de meu avô,
o mistério que faz o boi acordar

E o meu avô no resguardo de boi,
afogando a terra de barro e esterco
com as couro-asas na manhã,

deixando o barro esverdeado
apagar o barulho amuado,
plac-ploc de boi velho.

20151005

VERDUME

vindos da vertigem dos vendavais
os vaga-lumes vadiam no vaivém
de veros vândalos viris
vestidos de verde vertem veneno nas ventas
varam, de viés, o véu do ventre
e  (madalenas)

as vacas voejam voláteis
vagam a vertente dos ventos
e varrem a volúpia dos viventes,
os vaqueiros

os vadios e viciados em vodca
e (ceres entre cereais)

é venal o vodu da vida
e venial vênus virar vésper

20150711

Não sei quem

não sei quem
não nasceu

nasceu mas
não chorou
o choro vermelho

o pai meteu
as plantas no umbigo.

e a mulher
não sei quem
morreu a caminho do inferno.

20150710

Sunflower

Abri a boca, sem pensar,
Para falar o meu nome
Mas quando abri a boca,
Sem pensar, para falar
O meu nome, esqueci
A boca aberta, sem pensar
Passei a vida assim, sem
Pensar, com a boca aberta
Quando morri assim, sem
Pensar, com a boca aberta
Sunflower
Fecharam a minha boca
Com as mãos do amor eterno.

20150602

OhVida

Nada tão frágil assim como
A frágil pétala frágil no outono

Nada tão frágil assim como
A frágil pétala frágil no inverno

Nada tão frágil assim como
A frágil pétala frágil na primavera

Nada tão frágil assim como
A frágil pétala frágil no verão

A vida tão frágil assim como
A vida no coração do amor.

Eu te amo, mas em que língua
Escrever o coração de amor assim 

autumnwinterspringsummer

20150530

A ENXÓ

a árvore no coração do bosque
cercada entre musgos e urzes
há de me servir

herdeiro de meu ancestral,
a longeva e tão gasta enxó
há de me servir

há de me servir sim
a longeva e tão gasta enxó
en-

talhe de caule talhe de dorso

20150523

ENCHENTE

Maldito, o boi morto colore o meu espanto,
e a insônia no pântano atravessa a resistência ecológica,
onde há peixe morto sobre o boi morto,
onde há peixe morto na capanga de quem sobe o espigão
e vara a chapada, atingindo o lado do sertão.

Maldito,
o boi morto espanta o caçador de mosca, trágico!
Lascivo o rio paranaíba, da nascente ao mar,
arrasta o seu corpo de réptil dourado,

e a enchente estraga a tela verde ao longo da margem.

Arco-Íris

O Cavalo não é olavac
O Pássaro não é orassáp
E
O Menino não é oninem
Mas o menino é um olavac
E quando vira cavalo
V
ira arassáp

20150425

CONSTELAÇÃO

edeixei o menino
Quando o meu pai gemia
E morriae
edeixei o menino
Quando a minha mãe gemia
E morriae
edeixei o menino
Quando o menino
evivia egemia emorria egemia e
aogemer e morrer o meu pai
aogemer e morrer a minha mãe
eudeixei o menino
Mas o menino não me deixou
e

20150312

Mas

O amor é ar
Mas o amor é ar
Sendo terra

O amor é ar
Mas o amor é ar
Sendo água

O amor é ar
Mas o amor é ar
Sendo fogo

O amor é ar
Mas o amor é ar
Sendo amar

Sendo amar
mar e mar 
ar e ar

20150221

VOX

Eu olhei o céu e
Não vi o azul que olhei

Eu olhei o sol e
Não vi a estrela que olhei

Eu olhei a lua e
Não vi a noite que olhei

Eu olhei as estrelas e
Não vi a constelação que olhei

Eu olhei a terra e
Vi o céu em você

E vi o sol em você
E vi a lua em você
E vi as estrelas em você


E ouvi o coração